segunda-feira, 8 de junho de 2009

Recomeço

O recomeço não tem idade. Viver uma história de amor (mesmo que platônica) pode trazer uma sensação inigualável. Cheiro de novo, frio na barriga, um sorriso contido, aquele olhar meio de lado, aquele beijo, a lágrima (seja de tristeza ou alegria)... É a adolescência que nos ataca como um vírus potente, que não nos deixa de cama, mas febril.
Assim como uma gripe, você sabe bem o que te espera. Conhece todos os jogos iniciais, a troca de carinho, a futura cumplicidade (se sorte tiver), a amizade, o calor (sentido no olhar), os cafés da manhã e o inevitável fim.
Nessa paixão (mútua ou não) a única consequência certa e crucial chama-se renovação. Quando todas as nossas células se entregam a esse vírus que não determina idade, apenas pretende provar como amar é importante.
Pode-se ter 30, 50, 70 ou 80 anos. Ninguém é velho demais para passar por isso, nem bobo demais para sofrer por isso. A relevância da vida (mesmo soando presunçoso) está nas mãos dadas, no bate papo íntimo e nas coisas mais simples como um perfume, uma roupa especial, um toque...
Romântico demais? Pode ser, mas isso é ruim? Por que será que depois de uma certa idade esquecemos como é bom viver um romance de verdade? Será que a vida não faz mais sentido quando isso acontece? Será que não nos sentiríamos mais vivos assim?
Não sei. Talvez tudo isso seja bobagem, um devaneio qualquer de um dia frio. Mas talvez (talvez, repito) não. Talvez em algum momento perdido (no tempo e no espaço) você deixou de reparar na mesa do lado; deixou de perceber quem está na cozinha de casa (tão perto); deixou de convidar aquela pessoa para sair... e aí, pode ter perdido a grande oportunidade de rejuvenescer e de amar.

* Milamor. Lívia Garcia-Roza. Ed. Record.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Teatro Futebolístico

Em uma época não muito distante teve gente que viu o melhor do futebol nacional. Peço perdão aos não-santistas (apesar de achar uma pena), mas não há torcedor (de qualquer time) que tenha visto Pelé e passado impune por isso. A Vila (mais famosa do mundo) foi o palco desse teatro futebolístico. Lugar que fez com que muitas dessas pessoas mudassem a forma de ver o mundo (ou talvez de ver o futebol).
Uma dessas pessoas, inclusive, me mostrou, com orgulho, a folha de jornal velha em que há o registro da primeira bandeira hasteada na Vila Belmiro. Feita por ele e um amigo (na época, adolescentes), me contou que não precisaram de quase nada – só uma grande ideia - além do pano branco no quintal, tinta preta e amor pela camisa alvinegra. Outros tempos? Nem tanto.
Hoje, o glamour do futebol terminou – a não ser pelos grandiosos salários. Jogadores se enrolam entre a vida social, a bebida, a igreja e os campos. Enquanto, ontem, muitos trabalhavam em outros lugares pela dificuldade de se viver somente da bola (como me disse, certa vez, Gilmar dos Santos Neves), nada mais funciona assim.
Porém, tem uma coisa que nunca muda, porque está acima disso tudo: os torcedores. Esses sim intensos, fervorosos... talvez, um pouco mais briguentos (com o passar dos anos), mas com a mesma paixão (e sem ganhar nenhum milhão).
É a democracia da bola. O amor por ela. A falta de vergonha. O choro. O riso. Tudo no mesmo campo e na presença (cruel) de um adversário. Na carga pesada dos clássicos. Na angústia de saber que é preciso ganhar para passar. Ganhar para chegar lá... em Tóquio ou em Dubai (seja lá para onde se vai).
Times, hoje, ganham mais do que personagens. Ganham filmes, livros, histórias. Seja o Jabaquara (grandes espanhóis), o Santos, o Corinthians, o Grêmio ou tantos outros... Vale tudo para contar a luta, a batalha, a queda, a superação e o jogo.
Devo lembrar que nem todos eles tiveram Pelé (essa é uma sorte de poucos). Mas todos têm (até hoje) algo que só o futebol pode fazer: a mobilização da massa. A torcida está em todos os lugares. Campos, de frente a TV, ouvindo rádio ou a internet.
Nós (torcedores) estamos até onde nossa paixão nos permite ir. Até onde podemos gritar (atrocidades que me recuso a divulgar aqui), pagar, passar mal e xingar aqueles milionários pernas de pau!
E assim vivemos. Sem Pelé. Sem Garrincha. Sem Coutinho ou Tostão. Mas... cheios de histórias e títulos para contar e (quem sabe?) ainda chegar.

* Veneno Remédio: O futebol e o Brasil. José Miguel Wisnik. Cia. das Letras.